Parâmetros populacionais e padrões de uso do habitat de três peixes abundantes (Micropogonias furnieri, Diapterus rhombeus e Atherinella brasiliensis) na Baía de Sepetiba, Rio de Janeiro, Brasil: uma abordagem a partir da estrutura em tamanho

Abstract

Baías são ecossistemas de extrema importância ecológica para os peixes, principalmente espécies estuarino-residentes que passam todo o ciclo de vida nestes ambientes, e jovens de espécies marinhas que utilizam suas águas como áreas de berçário ou durante parte do desenvolvimento inicial (espécies estuarino-dependentes). Tais ambientes são altamente dinâmicos, com variações espaciais e sazonais das condições ambientais o que propicia uma excelente oportunidade de avaliar os padrões de estrutura populacional das espécies abundantes. A ictiofauna da Baía de Sepetiba tem sido estudada desde a década de 1980 através de amostragens experimentais padronizadas de arrastos de praia e de fundo, onde se destacam em abundância três espécies com diferentes estratégias de uso do habitat e diferentes histórias de vida: a corvina -Micropogonias furnieri (Desmarest, 1823), a carapeba - Diapterus rhombeus (Cuvier, 1829) e o peixe-rei - Atherinella brasiliensis (Quoy & Gaimard, 1825). Neste estudo, a estrutura em tamanho foi a ferramenta utilizada para estimar os parâmetros populacionais e inferir os padrões de ocupação do sistema estudado. A corvina utiliza a baía como área de berçário, possui um longo período de recrutamento com jovens presentes nas praias durante todo o ano, sendo raros no verão, enquanto sub-adultos usam águas mais profundas no interior da baía até atingirem a maturidade sexual, migrando para a plataforma continental adjacente com um tamanho aproximado de 25 cm de comprimento, correspondente a até três anos de idade, configurando a fase de pré-maturação da espécie. A carapeba está presente na baía em todos os estágios do ciclo de vida, com pico de recrutamento no verão; os jovens estão presentes nas praias em maior abundância no verão e outono. À medida que atingem maiores tamanhos os indivíduos se movimentam gradativamente em direção às águas mais profundas da baía com características oceânicas. Este padrão de variação espaço-temporal da estrutura em tamanho foi consistente ao longo do período de estudo, assim como os parâmetros populacionais que se mantiveram estáveis e indicaram que a espécie tem uma longevidade de aproximadamente 7 anos, atingindo um comprimento assintótico próximo aos 30 cm. O peixe-rei completa o ciclo de vida em águas rasas estando presente em todas as praias amostradas e ao longo de todo ano, porém as maiores densidades são registradas no verão; os jovens preferem águas calmas de ambientes estruturados, ao passo que os adultos, as praias com águas mais transparentes. A espécie possui ciclo de vida curto (aproximadamente 3 anos), pequeno porte (comprimento assintótico de 17 cm) e um prolongado período de recrutamento. A dinâmica de produção das coortes de A. brasiliensis mostrou-se sensível a eventos climáticos de larga escala, quando foram registrados recrutamentos pouco expressivos e rápido desaparecimento da coorte parental em decorrência do forte evento de El Niño ocorrido em 1997/1998. A exploração de séries temporais anuais de dados bióticos (e.g., comprimento e peso individual) padronizados e repetidos permitiu avaliar a estabilidade dos parâmetros populacionais ao longo dos anos, o que sugere um ajuste do uso do habitat por estas populações. O uso destas três espécies abundantes dentro de uma baia tropical permitiu concluir que a estrutura em tamanho de populações é uma ferramenta eficaz para análise de importantes aspectos bioecológicos de peixes com diferentes estratégias de histórias de vida, que compartilham distintos padrões de ocupação do habitat estuarino.